Entrevista de Fernando Rosso com Claudio Katz
07/09/2025 (Huella del Sur)

Transcrição da entrevista de Fernando Rosso com Claudio Katz no programa “El Círculo Rojo”, da Rádio Con Vos, na tarde do sábado anterior.
FR: Estávamos lembrando agora há pouco que você já esteve por aqui faz algum tempo, quando o “Círculo Rojo” ainda estava em outro horário e em outro estúdio. Eu me lembro daquela conversa em que, provocativamente, fiz um pouco o papel de advogado do diabo e perguntei: “Isso pode funcionar?” Lhe perguntamos isso, e você respondeu de forma categórica que não.
Bem, agora está de volta. Estou falando com Claudio Katz, economista, doutor em geografia, pesquisador principal do CONICET e professor da UBA. Autor de vários livros: Sob o império do capital; Neoliberalismo, neodesenvolvimentismo e socialismo; A teoria da dependência 50 anos depois; América Latina na encruzilhada.
Claudio, como vai?
CK: Tudo bem, um prazer. Como vocês estão?
FR: Bem. Você disse há um tempo: “Por isso e por aquilo, esse projeto vai entrar em crise.” Hoje parece uma verdade óbvia, mas naquele momento havia muita gente empolgada com a ideia de que funcionasse ou, ao menos, com a esperança de que pudesse funcionar. Em que momento da crise estamos agora, no caso deste governo?
CK: Estamos em um momento supercrítico, porque agora se confirmou que temos um presidente estelionatário, já com o caso Libra, uma irmã envolvida em propina, uma equipe de ladrões que, com crueldade infinita, roubaram até os deficientes. A constatação disso mudou o humor social. Há uma virada muito forte.
Agora não se trata apenas de um ajuste – um ajuste que se prolonga, interminável, e que não produz os resultados prometidos –, mas percebemos que fazem o ajuste para embolsar 3%. E isso está apenas começando, porque a sucessão de escândalos está só em seu início.
FR: Sim, todo dia surge um novo.
CK: Exatamente. E é importante que o detonante dessa virada, dessa decepção, seja a corrupção. Porque Milei chegou ao poder com aquele discurso de acabar com a “casta”, de renovar o sistema político – e o que temos diante de nós é um grupo de marginais, de estelionatários, de ladrões, de gente que saqueia os cofres públicos. Estamos em um ponto crítico, porque Milei perdeu os governadores, perdeu o Congresso, perdeu o mercado. Já não dita a agenda, parece que nem as redes sociais controla mais, os meios de comunicação estão se afastando dele, e veremos amanhã o resultado eleitoral. Já não há o triunfalismo de um mês atrás, e eles sabem que, em qualquer cenário, a crise – pela intensidade que tem – vai se aprofundar.
Para mim, o interessante é que se percebe agora que Milei é um aventureiro, um representante de um setor que chegou à presidência de maneira completamente inesperada e que não sabe como lidar com uma crise dessa magnitude. Deteriorou o funcionamento do Estado, violentou as regras da política tradicional – e uma crise desse tipo não se resolve com tweets, com palhaçadas, com gritos ou escândalos. Ela se administra com políticos experientes.
E veja a diferença. Menem tinha escândalos de corrupção desse tipo a cada cinco minutos, mas ria, porque controlava o sistema político, os governadores, os mecanismos do Estado. Macri teve escândalos semelhantes, mas dispunha do poder judicial e da estrutura dos meios de comunicação.
Já este homem está francamente desorientado e não sabe o que fazer. E essa é uma das razões pelas quais a crise é tão, tão forte.
FR: Se você olha para o outro círculo vermelho, o dos empresários, o que acha que eles pensam? O que estão projetando? Porque há aí algum tipo de movimento, talvez com os governadores, com Pullaro em Santa Fé, dizendo: “Bem, vamos ver se conseguimos ajeitar isso para colocar alguém” — ou até intervir no governo. Porque, como você mencionava, até em 2001, Duhalde e Alfonsín se juntaram, dois políticos experientes, e tentaram arrumar as coisas à sua maneira — para os próprios interesses, claro. Que alternativas você acha que eles estão considerando?
CK: Estão pensando em várias alternativas, mas me parece que o ponto de partida de todas elas é constatar que isso não vai mais.
Sim, isso não vai mais porque eles já perceberam que o que Milei pretendia fazer não deu certo. Ele queria construir um projeto político com base social popular, um projeto que mobilizasse contra a “casta”, aproveitando a grande decepção deixada por Alberto Fernández. Mas não conseguiu construir nada. Diferentemente de Bolsonaro ou de Trump, ele não formou um partido, não tem congregações religiosas, não tem apoio militar, e sua ideologia também não conseguiu se enraizar.
Essa ideia anarcocapitalista que ele começou a difundir nem sequer se conecta com a tradição liberal argentina — está divorciada até das próprias raízes do liberalismo argentino. Além disso, ele brigou com Villarruel, e ao fazer isso destruiu o outro pilar ideológico que sustentava o governo, o nacionalismo militar reacionário.
Essencialmente, o que o grande capital vê é que Milei não conseguiu realizar o que esperavam dele: dobrar de forma radical o movimento popular.
Passaram-se dois anos em que a repressão aumentou muito, mas ele não conseguiu generalizar o uso do protocolo antipiquetes, porque há manifestações e lutas em todos os lados. É verdade que nenhuma dessas lutas se transformou em uma grande mobilização nacional que mudasse a correlação de forças — ainda não vimos um “2017”, como aquele momento em que a luta contra a reforma previdenciária mudou o cenário para Macri. Esse ponto de virada não chegou, mas o que existe é uma disseminação de conflitos de todo tipo — alguns muito visíveis, como o do Hospital Garrahan, e outros mais setoriais, quase desconhecidos, mas que desestabilizam o sistema político.
E, sobretudo, depois de dois anos, o que se demonstra é que Milei não conseguiu destruir os sindicatos, nem demolir as organizações sociais, nem derrubar o movimento democrático, nem alterar de forma duradoura a correlação social de forças. Então, os poderosos tomam nota disso — e olham para seus próprios interesses. Ou seja, olham para a economia, para o que aconteceu nesses dois anos.
Acho que o cálculo de todos era o seguinte: “Esse homem vai aplicar um ajuste. Esse ajuste vai nos custar caro, a nós, os grupos dominantes, porque no processo ele vai destruir o movimento popular. Mas, tudo bem — perdemos agora, para ganhar estrategicamente depois. Queremos empresas menores, mas sem sindicatos.”
O problema é que Milei está deixando as empresas menores, muito menores — tão pequenas que já nem se sabe se continuarão existindo como empresas. Então, em nome de ter uma empresa sem sindicato, estão ficando sem empresa. A classe dominante começa a dizer: “Espera aí, até onde vamos chegar com esse modelo econômico?”
Veja, agora sim entramos em um ponto realmente crítico. Crítico porque se esperava que, mais ou menos nesta altura, depois do ajuste, a economia começasse a se estabilizar e alguma luz aparecesse no fim do túnel. Mas estamos indo direto, direto, direto para uma crise de proporções — e em dois planos.
O primeiro: vem aí uma nova desvalorização forte, ou um novo controle cambial (“cepo”) para evitá-la — mas, de qualquer forma, estamos na mesma situação.
FR: Melconian, Broda, Cavallo… já não sobrou ninguém. Arriazu era o último que ainda o assessorava, e ele o perdeu semana passada. Não restou nenhum, porque todos veem que, se já temos taxas de juros que triplicam a inflação — algo completamente delirante — e ainda assim não se consegue conter a demanda por dólares, é porque a desvalorização é inevitável.
CK: Além disso, há uma bomba fiscal. Todo esse papo de que “o modelo tem problemas, mas temos superávit fiscal” é ridículo. E quem entende de economia sabe disso. É uma maquiagem contábil, uma farsa completa.
Você capitaliza, muda os registros contábeis, mas quem é que engana com isso? Há um déficit descomunal, e isso se vê claramente: o governo não consegue que aceitem seus títulos públicos. Semana após semana, tenta refinanciar, oferece taxas cada vez mais absurdas, e os bancos respondem: “Mais juros, mais juros, mas não queremos títulos em pesos.”
E a razão é muito simples: eles sabem que não vão receber o pagamento. Em algum momento o governo vai dizer: “Bem, tenho que te avisar que vem aí um default, uma reprogramação de pagamentos, um reperfilamento.”
O carry trade se esgotou. Não há mais como sustentar essa bicicleta financeira. Então, desvalorização, bomba fiscal — e tudo isso até poderia ser suportado se a economia produtiva não estivesse em ruínas. Porque, quando a estrutura produtiva entra em colapso, nenhum ajuste financeiro dá jeito.
Estamos passando de um simples estancamento para uma nova recessão muito profunda, com todos os seus efeitos. E mesmo com o RIGI oferecendo tudo o que quiserem aos investidores, não chegou um único investimento estrangeiro. Pior: as empresas estão indo embora e vendendo seus ativos para argentinos.
E por que as empresas vão embora? Porque sabem que a Argentina não vai pagar a dívida, como aconteceu periodicamente nos últimos trinta anos. Essa desconfiança generalizada leva o governo a buscar outro rumo — porque há certo descontrole até na política econômica estratégica.
Há algo estranho: Milei é o “Trump da América Latina”, mas faz exatamente o oposto de Trump. Está navegando contra a corrente no plano econômico.
Trump fortaleceu o mercado interno; Milei o destrói. Trump fechou importações; Milei as abre.
E o problema é que Milei está submetendo a economia argentina a uma potência em declínio. Isso é muito complicado, porque é um dos poucos países que decidiram apostar seu destino numa economia que está em queda. Assim, perde uma oportunidade atrás da outra — e o círculo vermelho começa a se perguntar: “Mas o que estamos fazendo?”
FR: Nem falar se adicionarmos o apoio a Israel, não é? Justo em um momento em que o país está ficando isolado do mundo.
CK: Por onde quer que se olhe: o que estamos fazendo? Perdemos o mercado asiático. A China se irritou tanto com a Argentina que agora prefere comprar do Brasil. Não entrar nos BRICS — o grande mercado, com quarenta países fazendo fila para tentar entrar — e Milei diz: “Não, não, não quero saber disso, não me interessa.” Então, é completamente evidente que os grupos econômicos estão percebendo que estamos perdendo negócio atrás de negócio.
Se você olha historicamente, é como uma repetição do pacto Roca-Runciman, quando a Argentina, nos anos 1930, se amarrou à decadência do Império Britânico e perdeu uma oportunidade de desenvolvimento. Há hoje uma grande virada mundial, e este homem está se jogando para o lado que afunda.
E, então, te respondo: o que o círculo vermelho vê? Que há duas possibilidades imediatas. A primeira é que, depois dessas eleições — ou das próximas —, haja um grande “reset” do governo e tudo comece de novo. E “começar de novo” significa que o establishment impõe tudo a Milei.
Tudo é tudo: a política econômica, o ministro da Economia, o rumo estratégico, e uma espécie de Guillermo Francos conduzindo uma nova relação com os governadores.
FR: Difícil imaginar o cara amarrado assim… teriam que dopá-lo, não?
CK: Exato, exato. O establishment diz: “Isso só se salva se a gente não apenas o dopar, mas também o amarrar — e ele aceitar se livrar, pelo menos, do clã Menem.” O clã Menem foi trazido para roubar. Pois bem, o clã Menem não pode continuar. E a irmã, veremos… talvez digam: “Ok, deixe a irmã, mas só ela, e que ele aceite isso.” Praticamente todos os meios de comunicação estão falando disso, porque é isso que eles querem.
E o que temem é que isso não aconteça. E por que pode não acontecer? Por causa do personagem.
FR: Claro, aí entra o detalhe fino da questão.
CK: Aí entra, sim. Há duas possibilidades. Veja: há duas “bibliotecas”. A primeira diz que ele é um palhaço, mas que, embora palhaço, quer tanto o poder que vai aceitar o que vier. Essa é a biblioteca número um.
A segunda diz que ele é um palhaço, palhaço mesmo, que não aceita nada e que vai continuar no seu próprio caminho. Agora, se ele continuar no seu caminho, vamos para algo parecido com 2001 — porque é óbvio que vai perder toda a base, todo contato com a realidade.
FR: Como De la Rúa, que continuou no seu rumo, à sua maneira. Não era como este personagem, mas ainda assim…
CK: Exato. E, então, empurra o país para um cenário desse tipo.
FR: Estamos conversando com Claudio Katz. Parece que ele não vê muita solidez no modelo econômico, não está muito convencido, digamos. Ele é economista, professor da UBA, autor de vários livros — e amigo nosso, além de tudo.
Pablo Anino: Claudio, eu queria te perguntar algo, porque nesse drama argentino a gente pensa: bem, talvez surjam alternativas — talvez para a semana que vem, talvez depois de outubro, não se sabe. Mas, ao mesmo tempo, já houve desvalorizações cada vez mais frequentes; nos últimos dez anos a economia argentina está estagnada. E, olhando o panorama latino-americano e mundial, não parece haver um contexto que colabore para uma mudança estrutural de política econômica. Como você vê as possibilidades nesse cenário global? Como situa o drama argentino dentro desse mundo?
CK: O drama argentino é um drama tanto para a Argentina quanto para a classe dominante — e também para a ultradireita mundial. Porque, como você bem sugere, não estamos em 2001 ou 2002, quando uma virada econômica podia coincidir com um cenário internacional favorável, dando à Argentina um grande alívio — como foi aquele período de crescimento com “taxas chinesas”.
Nada disso existe hoje. Nada. Esse é um problema sério, porque o modelo precisa mudar — mas mudar para onde? Nem eu sei, nem você sabe, e nem eles sabem, porque apostavam tudo nesse caminho.
E agora, como se faz a virada? Eu acho que a crise mostra que Milei é também um problema em nível internacional. Porque lembre-se: ele é um experimento da ultradireita mundial, que está observando com muita atenção o que acontece aqui. E, se isso terminar mal, será um problema também para os Estados Unidos e para Trump — porque toda a estratégia geopolítica trumpista para a América Latina se apoia, em grande medida, em Milei.
Não é a mesma coisa atacar a Venezuela, atacar Cuba, ou enfraquecer governos progressistas com o apoio do Equador, que é o único que eles têm agora. Marco Rubio, para essas aventuras militares que está preparando, foi ao Equador — mas antes vinham todo o tempo à Argentina. Agora, o que fazer com a Argentina? Antes, eles vinham a cada semana. Milei, claro, viaja aos Estados Unidos como um servo fiel. Aconteça o que acontecer — no país, na casa dele, na vida dele —, ele vai aos Estados Unidos.
Simplesmente, desta vez não foi a Las Vegas ver a namorada, seria demais — mas foi para os Estados Unidos. É quase um reflexo automático: quando ele tem um problema, busca proteção. É o seu instinto.
FR: Eu, quando tenho um problema, tomo um ibuprofeno. Ou vou para a casa da minha mãe.
CK: Ele vai para os Estados Unidos. Um tolo, um estelionatário — e, como se o caso Libra não bastasse, vai encontrar outro estelionatário. Mas ele vai e volta, em plena crise. É um servo. Mas esse é ele. Agora, para os Estados Unidos, ele é um problema. Um problema muito sério. Por isso, há tanta atenção de todos sobre o que acontece aqui. Estamos no meio da tormenta. Ainda não há projetos substitutivos em andamento — apenas cartas de curto prazo para tentar sair dessa.
FR: Deixa eu emendar essa pergunta com um debate que vem acontecendo por aqui e que estamos acompanhando de perto — e que ganha outro sentido com a crise desse projeto político —, que é a questão da consistência e da natureza dessas novas direitas.
Muitos falam em “populismo autoritário”; outros preferem dizer que já são expressões de tipo fascista. É um debate mais conceitual, e eu mesmo já discuti essas ideias, tentando não atribuir a elas uma consistência que não têm — não por negar que sejam autoritárias ou moralmente condenáveis, mas por entender que o conceito de fascismo clássico é outra coisa. Como você vê essa discussão sobre o que são essas novas direitas?
CK: Olha, para mim, o conceito que as unifica seria o de “autoritarismo reacionário”. É uma definição que está um degrau abaixo do fascismo, mas que mantém alguns vínculos com ele.
O que é o autoritarismo reacionário? É o autoritarismo dentro do sistema político atual — sem transformá-lo em algo totalmente diferente, sem instaurar um regime de terror de Estado ou de totalitarismo. Ou seja, é atuar de forma repressiva e antidemocrática, mas dentro das regras formais do sistema existente.
Você criminaliza o movimento popular, persegue opositores, impõe ajustes brutais — mas ainda dentro da moldura institucional. E “reacionário” porque cada uma dessas direitas agrega a ideologia conservadora ou regressiva que preferir.
Isso é um pouco o caso de Milei. Eu acho que esse tipo de regime se estabiliza como “autoritarismo reacionário” quando consegue dobrar o movimento popular e disciplinar o sistema político.
Onde isso funcionou? No Peru. Lá, com o golpe de Estado e o governo de Dina Boluarte, você tem um sistema autoritário funcionando: presidentes são trocados constantemente, mas o modelo econômico permanece estável.
FR: O presidente do Banco Central é o mesmo há vinte anos.
CK: Exatamente. Mudaram oito presidentes, mas o presidente do Banco Central continua o mesmo, o Judiciário segue firme, e as Forças Armadas atuam como pilar repressivo. Aí está um exemplo de autoritarismo reacionário em operação.
Na Argentina, houve — ou há — uma tentativa de algo assim, mas que não está funcionando. O problema é que o Peru era imaginado como o primeiro passo em direção a uma “peruanização” da Argentina — e Milei não conseguiu chegar nem a isso, porque destruiu a própria base institucional do sistema político.
FR: Bem, Caputo chegou a mencionar o Peru, e muito se discutiu aqui sobre essa “peruanização” possível.
CK: Sim, mas, diferente do Peru, a sociedade civil argentina é outra história. Se eles tivessem conseguido avançar até o ponto do Peru, então o debate sobre o fascismo ficaria mais sério. Porque, se você já tem algo como o Peru, então sim: há elementos fascistas, semifascistas — ainda que não plenamente fascistas — no modelo.
E, claro, em Milei isso se acentua: tanto no plano ideológico, com o discurso de ódio, o macartismo, a cloaca em que transformaram as redes, quanto no plano pessoal — com as “forças do céu”, a retórica messiânica, a estética de Mussolini, Espert com suas provocações, a defesa do genocídio.
Há, sim, elementos de fascismo, de neofascismo, na conduta de Milei. Mas é preciso cuidado com o uso do termo. Não devemos nem desconsiderar o fascismo nem supervalorizá-lo.
Acho essencial manter uma distinção clara em relação ao fascismo clássico. Não estamos num período histórico semelhante ao dos anos 1930: não há guerra entre potências equivalentes, não há um processo revolucionário em curso, não há um projeto comunista ou socialista que precise ser destruído, nem um movimento operário organizado a ser aniquilado. É outro contexto.
Mas, em todo o mundo, há componentes, traços, elementos de neofascismo — e é importante reconhecê-los. Então, é preciso ajustar essa caracterização ao caso argentino, levando em conta que a personalidade de Milei o aproxima muito de uma perspectiva fascista, mas em um cenário que ainda está muito longe disso.
FR: Claudio, voltando à Argentina: como sempre, quem sofre as consequências será a maioria trabalhadora. Por isso, também é preciso apostar em outra coisa, em outro horizonte político.
CK: Sim, e uma última observação sobre esse tema. Se tudo der errado para Milei — como tudo indica —, isso também será um golpe para o projeto de construir uma internacional reacionária. Lembre-se: Buenos Aires se transformou no centro de peregrinação de todo fascista do mundo.
FR: O Moscou deles.
CK: Exatamente. E o problema é: vale a pena visitar um fascista ladrão? Vale a pena vir à Argentina agora, para o VOX? Compensa continuar vindo quando o fascista ladrão está derrotado e isolado?
Isso é importante, porque o discurso antifascista começou a ganhar força quando Milei atacou o movimento de diversidade sexual. Ali, ele foi identificado claramente com a intolerância — um dos traços do fascismo. Mas agora, ele é não só fascista, mas também ladrão — e isso está virando canto popular: “Karina com 3%”.
Então, é um fascista ladrão derrotado — e isso é uma grande oportunidade para nós. Uma grande oportunidade para que, sobre o cadáver político desse homem, a esquerda avance, se consolide e apareça como alternativa real.
FR: Que ninguém mexa em nada, por favor, que continue assim. Claudio, obrigado.
Texto original publicado em Huella del Sur.
Tradução livre para o português.