A atualidade de Fidel

Atilio Boron
13/08/2025 (Página 12)

Há 99 anos nascia em Birán, Cuba, Fidel Castro Ruz. Não vou ceder à tentação de escrever, ainda que seja, uma brevíssima biografia desse personagem excepcional e inabarcável. E essa adjetivação se justifica plenamente pelo papel destacado que o líder cubano desempenhou não apenas em seu país, mas também na política mundial. A internet está repleta de listas convencionais dos grandes estadistas do século XX: quase nenhuma inclui Fidel, embora incluam praticamente todos os presidentes dos Estados Unidos ou os principais políticos europeus — todos funcionários estatais das grandes potências do antigo sistema colonial, como Winston Churchill, ou dóceis peões do imperialismo norte-americano, como o egípcio Hosni Mubarak. Mas, se o que se pretende é examinar como esses personagens atuaram na arena internacional, no caso de Fidel — desde uma ilha do Caribe e lutando contra a corrente para pôr fim à ignominiosa submissão imperial de que seu país era vítima —, sua figura se eleva a alturas que pouquíssimos alcançaram naquela época.

Mesmo levando em conta os grandes líderes anticolonialistas da segunda metade do século passado — pensemos em Nelson Mandela, Mahatma Gandhi, Mustafá Kemal Atatürk (na primeira metade do século), Kwame Nkrumah, Patrice Lumumba, Indira Gandhi ou Yasser Arafat —, a influência global de Fidel vai muito além da que esses conseguiram exercer. Mesmo em Nossa América, figuras tão queridas e coerentes como Augusto César Sandino, Salvador Allende, Luiz Carlos Prestes, Farabundo Martí, o próprio Emiliano Zapata e Eliécer Gaitán (com exceção do brasileiro, todos os demais assassinados ou mortos em combate) não lograram consolidar um legado revolucionário como o que Fidel nos deixou.

A exceção, já em nosso século, é a extraordinária figura de Hugo Chávez Frías, também projetada mundialmente, mas sob circunstâncias muito diferentes das enfrentadas por Fidel — e também ele, como seus predecessores acima mencionados, morto prematuramente e em circunstâncias estranhas. Apesar disso, o legado do chavismo é notável, algo que hoje pode ser facilmente comprovado.

A genialidade de Fidel combinava um notável talento militar, uma incrível capacidade de leitura, uma memória prodigiosa e uma formação intelectual digna de um acadêmico de alto nível — algo em que apenas Chávez se encontrava praticamente à sua altura. E além disso, um guerreiro que teve de enfrentar a implacável virulência de um império que não conseguiu dobrá-lo, apesar da descomunal desproporção de forças no terreno militar. Fidel, dotado de uma inteligência próxima do genial, via mais longe e mais fundo do que seus inimigos e detratores, que tentaram assassiná-lo mais de seiscentas vezes. Mas não conseguiram: era um gigante acossado por pigmeus — ainda que estes tivessem mais recursos financeiros, militares e de todo tipo.

Enfim, abarcar neste breve texto todas as facetas desse personagem que parecia provenir “de outra galáxia” exigiria transcrever integralmente a brilhante biografia de Fidel escrita por Katiuska Blanco Castiñeira. Contento-me em recomendar enfaticamente a quem leia estas linhas que veja e ouça o discurso premonitório de Fidel na Primeira Cúpula da Terra, no Rio de Janeiro, em junho de 1992. O que hoje todos dizem — inclusive politicastros de quarta categoria alçados ao governo sabe-se lá por quais razões obscuras —, Fidel já dizia em pouco mais de cinco minutos naquele discurso diante do plenário da Cúpula. Ali, ele advertiu que a espécie humana estava em perigo pela destruição do meio ambiente, antecipou o caráter catastrófico das mudanças climáticas que hoje sofremos e as consequências da depredação que os capitalismos desenvolvidos estavam promovendo com total irresponsabilidade, mergulhando os países do Sul Global na miséria.

Muitos na plateia o ouviram com um ar de condescendência zombeteira: “Lá vem Fidel outra vez com seus sermões apocalípticos!”. Quem eram aqueles personagenzinhos soberbos que a história sepultou impiedosamente? George Bush (pai), Fernando Collor de Mello, Carlos Salinas de Gortari, Carlos Saúl Menem, Felipe González (transformado em lobista de empresas espanholas), Jaime Paz Zamora, Patricio Aylwin, César Gaviria, Guillermo Endara, Andrés Rodríguez, Alberto Fujimori, Luis Alberto Lacalle e Joaquín Balaguer. Quem se lembra hoje desses personagens minúsculos? Poucos — e, quando o fazem, é para amaldiçoá-los.

Fidel, em contrapartida, falou, e suas palavras ficaram gravadas em pedra. Hoje, quando estamos à beira de uma catástrofe ecológica irreparável, as vozes de alerta ressoam cada vez mais fortes. Preparemo-nos para, no próximo ano, celebrar como se deve o centenário de seu nascimento.

Texto original publicado no jornal Página 12 (Argentina).
Tradução livre para o português.

https://www.pagina12.com.ar/849433-la-actualidad-de-fidel

https://www.pagina12.com.ar/858663-las-guerras-del-imperio-en-latinoamerica-y-el-caribe

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